quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

[és a parte que se perde de mim]


és a parte que se perde de mim
que parte sem aviso ou despojo desejo
insinuando o fogo

e o pensamento mais puro desta vida breve.

tudo reconstruo então

[menos as sombras]
que desaparecem pela noite afogando o eclipse
envolto pelos murmúrios dos amantes.

Desfiar-me-ia por ti

repentino

sem o sopro do vento aprisionado
alísio

algures a cegueira desassossega-me o tempo que resta
a alegria
as buscas patéticas
a apoteose
o caos.

Talvez a vontade resista

não o sei
jamais o saberei.

[sei-te

talvez]

(Ricardo Pocinho - O Transversal)


sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

[desconstrói o tempo algum egoísmo]


desconstrói o tempo algum egoísmo
que nada transmite indiferenças_____________________apenas
gravadas por um pássaro

depois

a fuga sem lágrimas sem fogo
sufocante como a prisão dos homens.

A voz retida nos teus escuros olhos
onde tudo se passou
corroendo

talvez um soluço ou um abismo breve
sabes dos luzeiros arriba acima
referência dos navegantes

e o sonho projetado num horizonte inexistente
o céu de infância

as horas e os dias certos intermináveis

deixaste as portas e as janelas abertas
contra as correntes do vento
indevidas
gélidas. nadas.

Reconstroem-se os corpos
antes decepados sem sexo
nexo

e as sementes deitadas ao acaso
convolaram-se por mais este inverno

[irei então]

desconhecendo o meu respirar
o teu grito

a miragem onde seria um mar

o mundo.



(Ricardo Pocinho em F.Duarte)


sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

[diz-me a cor do pranto]


diz-me a cor do pranto
enquanto me esvaio

aleatório no teu ventre

por entre as tuas mãos bem abertas.

Ignoro o tempo que se passeia
apenas tocado na sua orla
e não na plenitude verdadeira
exata

como numa visita rápida que se esgota
num instante após as chuvas
a boca fechada aguentando o respirar

ou o traço preso pela palavra esquecida

.ignoro-me

embora algures ninguém esbraceje
sob as águas calmas sem tormentas

velar-te-ei assim

nem que o sonho seja mor que cavalos alados
a trote por um desfiladeiro em fogo

e a mão cheia de flores acene ao avistar tranquilidade
dos pássaros pela noite.

O ventre e o pranto
mais uma braçada de mar
enquanto crescem desordenadas
as pedras no muro tombado

ficam imagens
que jamais me lembram o céu.


Faz-se tarde.


(Ricardo Pocinho)




sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

[apenas vos prometo:]

Janis Joplin Tribute 

apenas vos prometo:
se encontrar uma ilha deserta de safiras esverdeadas
deponho enfim a minha imagem por entre os anjos que chegaram no fim
alguns muito bêbedos
outros desconhecendo o amar.

num canto enclausurarei monstros
a morte

e

se o desprezo pela saudade reinar
incerto
reduzirei longitudes a nadas

. jazem em areal por perto
algumas pétalas
que deixaste amontoadas onde o vento passou

.arribam brisas repentinas
sôfregas
um dedal de azul céu

e

a boca repetindo o gesto ceifado naquela mimica vezes repetidas
o branco a ausência
o espanto esculpido  nesta terra barro

hoje a praia o nosso infinito.

. das vozes que se atropelam
sem as rugas do tempo
ou a eternidade do avesso pelo silêncio do grito
dilaceram-se sombras.

I

À flor da pele
aceitei finalmente


a nudez imposta.