sexta-feira, 21 de setembro de 2012

[ … mira a tatuagem qual prece que não se desfaz



mira a tatuagem qual prece que não se desfaz,
pedra que a salsa maresia roreja,
levemente,

suavemente, direi,

neste ruir de verão
em redemoinhos de folhas derribadas pelas foices do tempo.

Segregar-me-ei quantos os sargaços que vogam como náufragos,
longitudes já conhecidas, necessárias,
onde se ouvem estrelas, quais solilóquios pelos amanheceres
de súplicas sempre presentes,
desejos, sonhares,
podê-los-ei sentir na carne símiles à afiada sica.

Seja-me abnóxio o encadear novamente do olhar,
senti-lo-ei, sim,
vulcão adormecido, ressuscitado, encabrestado,
nesta verdade te direi,

sentir-te-ei sempre,
como as ondas adormecidas que se espraiam pelos meus pés
aguardando regresso teu.

Seja-me bravo o mar, então.




- Na verdade vos digo, os pássaros que morrem caem no céu e as cinzas de Maria Callas vogam pelo mar Egeu.” do ciclo uma sílfide adormeceu no leito de uma orquídea branca.


terça-feira, 18 de setembro de 2012

[ … e deixa a poeira destas encruzilhadas invadir]




e deixa a poeira destas encruzilhadas invadir
este tédio que me repete,
que me cobre como o tafetá,
santifica-me a emoção em escarlate, nudez essa
de teu peito coberto por nuvens em cirros,
mas...
ensina-me a colher o mel pelo ocaso
onde miçangas reluzem, estrelas cadentes também,
quando o mar se espraia para além das violetas adormecidas,
[clareia-me a noite].

Na verdade dir-te-ei,
pudesse ser eu o verso que treme pelo anoitecer,
pudessem ser as mores distâncias apenas o simples repirar,
pudesse eu afundar olhares de adamastores sempre irados,
pudesse sossegar-me como o aloé que nasce da estrada,
enquanto habitas estas divisões quais páramos em mim.

[E repetir-me-ei: ensina-me a colher o mel pelo ocaso...
que fazer, perguntar-te-ei].







- Na verdade vos digo, os pássaros que morrem caem no céu e as cinzas de Maria Callas vogam pelo mar Egeu.” do ciclo uma sílfide adormeceu no leito de uma orquídea branca.


   

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

[… e tantas são as viagens que me alumbram



e tantas são as viagens que me alumbram,
quiçá, pelos sonhos nunca dantes realizados
onde se degustam silêncios vogados ao vento,

que me ardem, ignescente memória,
estes olhos sem choro que miraram além da proa,
além das níveas montanhas.
Relembra-me, acolhe-me enquanto o ceu estreleja pelo entardecer dos dias em verão,

morram-me então as palavras que os deuses libertaram,
roçam o infinito desejo, quão perenes,
penetram mar adentro, quais viagens desassossegadas
mitigadas pelo som destes marulhares sempre presentes,
desde sempre.

Acolhe-me em sorriso, desnovelando
cousas incertas aprisionadas, ilusões outrossim,
relembra-me, uma vez mais,
da cor das cerejas dissipada por entre sussurros só nossos.

Inda me peregrino em mim, sabê-lo-ás.

[-Senti-lo-ás? Perguntar-me-ei.]





- Na verdade vos digo, os pássaros que morrem caem no céu e as cinzas de Maria Callas vogam pelo mar Egeu.” do ciclo uma sílfide adormeceu no leito de uma orquídea branca.



terça-feira, 4 de setembro de 2012

[… terra que não se afasta]




terra que não se afasta por mais que os remos
esbracejem pelo mar calado, manso,

singra-se de frente para o arvoredo
de onde se ouvem lamúrias distantes,
tão distantes.

Tanta cousa que resta, coração, entranhas,
e o pensamento acolhe o silêncio
que o sonhar transporta,
quão infindos os presságios que tudo tentam purificar
de nada valendo ser-se peregrino em si próprio.
E nascem magnólias em perenes múrmurios,
jamais choros ou tormentas,

e distantes de círculos ovais,
perigeus interiores,
soltam-se as vozes,
como elas se soltam, se clamam jamais o saberei.
[Interessar-me-á saber?]

Libertam-se das amuradas vagas que pululam sem destino,
empurrando para terra, fragilidades,
encantamentos,
na verdade, proclamam-se brandos os regressos,

que eu me regresse,
que estrelas continuem iluminando os caminhos,
encruzilhadas.

[Incandescentes caminhos nessa
terra que não se afasta, por mais que os remos
esbracejem, amor meu].




- Na verdade vos digo, os pássaros que morrem caem no céu e as cinzas de Maria Callas vogam pelo mar Egeu.” do ciclo uma sílfide adormeceu no leito de uma orquídea branca.



[ … e criam-se ciclos em circulos





e criam-se ciclos em circulos como se o amanhã chegasse breve quão rápido se desvanece o ignescente dia em verão que se dispersa sem jamais se ver.

Ainda te vejo a segurar algumas ondas
invocando as manhãs por onde nos despimos de nós,

nudez no salso mar só nosso por um momento.

Penso-te.

[Sentir-te-ei sempre quão perto este mar é de mim,
sentir-te-ei pelo silêncio das noites,
sentir-te-ei pelas auroras refletidas em corais infindos].

Olvido-me esperando-te.

Regressa a sílfide das orquídeas brancas que um dia me ofereceste
e mesmo que me segregue por breves momentos,

sempre ouvirei as estrelas quais rouxinóis que anunciam o teu amanhecer...

- E o mar ?” Perguntar-me-ás.

Jamais o deixarei longe de mim, responder-te-ei.

Jamais negarei que o tentei.






E o ciclo exorcisa-se.
Os ciclos são assim, acabam-se uns, começar-se-á outro algures no tempo e no espaço com outras palavras, outras experiências, outras histórias, ou sentimentos, outra escrita, e essa é a importância da palavra, reiventa-se.






[“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]

[ … sejam-me símiles à espuma do mar



sejam-me símiles à espuma do mar olhares teus,
quais santelmos anunciadores de bonança.

Segrego-me de aluviões, remoinhos, tormentas,
ameaças,
e quedo-me pelos sargaços distantes de terra,
que me abrigam.

Pelo alto mar habito-me entre um mastro e o vento,
revejo a praia deserta

onde se espraiavam ondeares teus,
onde as mãos entrelaçadas eram âncoras fundeadas.

Sentir-te-ei sempre quão perto este mar é de mim,
mesmo que numa breve noite se afoguem sonhos,

mesmo que numa breve noite me olvide para sempre de mim.

Que seja.



[“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]

[ … e quando as ignescentes estilhas se consomem



e quando as ignescentes estilhas se consomem,
renova-se pelo fogo o sentir julgado naufragado.

Alterosas as ondas que ouço em solilóquios crescentes,
rumores que se transformam em urros,
quão perto a crespa tempestade é de mim,

ribombam sussurros teus
nestes longínquos silêncios meus, amordaço o alvitrar
repentino, que renasce,
que se encabrita,

como os lírios pelo matinal orvalho.

Acrescento-me aos desconhecidos mares,
neste vai e vem, ah... ondear que me extasia,
e,
desfaço-me da partida nesse dia em adeus,
nos desencontros que foram as rotas nossas.

Que o mar uma noite me faça voltar,
aos braços teus.




[“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]

[ … leva-me pela mão até onde as roseiras bravas tapam


leva-me pela mão até onde as roseiras bravas
tapam as trilhas empedradas. Leva-me

até ao rio que dizias nascer no salso mar,
onde as lágrimas ficavam à superficie,
e um solitário arco-íris escondia os cintilantes refúgios lá longe.

Leva-me assim.

Deixa este corpo exausto, tão singrado sem rota,
arrojar-se do cendrado promontório
sentindo os aljôfares da fria noite.

Leva-me assim.

Quão longe hoje sou dos nossos sonhos pela excelsa
primavera algures no tempo,

e se conseguisse regressar-me um segundo que fosse,
pedir-te-ia:

- leva-me até onde as roseiras bravas libertaram
o aroma teu, que ainda hoje me inunda.


[Leva-me contigo, assim, só].




[“do ciclo, as palavras não têm prazo de validade. “ Riva la filotea. La riva? Sa cal'è c'la riva?” (Está a chegar. A chegar? O que estará a chegar?)]